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Direito da moda: entrevista com Silvia Segnalini




Entrevista realizada com Silvia Segnalini, advogada especializada e docente universitária da Università Sapienza di Roma (Itália).


A entrevista a seguir foi realizada em 13.08.2020 para a Revista Unsatisfashion número 2, que tem como tema central a questão da originalidade.


Quem é nossa entrevistada?

Silvia Segnalini é docente universitária da Università Sapienza di Roma e advogada. Atualmente, sou pesquisadora para a Università Sapienza di Roma, onde fui a responsável da cátedra de Direito da Moda na Facoltà di Scienze della Moda e del Costume.

Como advogada, trata principalmente do direito de arte, de moda, de legislação dos bens culturais e dos aspectos de direitos de autor, da propriedade intelectual e do direito civil-comercial diretamente ligado ao mundo da arte, do colecionismo, do luxo e da moda. Dá assistência a galerias, antiquários, casas de leilões, arqueólogos, arquitetos, designers e fashion designers, colecionistas e herdeiros de coleções (no momento da passagem geracional do patrimônio artístico), de indivíduos de alto patrimônio e de clientes privados para a valorização, gestão e proteção das coleções deles (incluindo, por exemplo, a recuperação de obras de arte roubadas dos judeus durante a Segunda Guerra Mundial).

É autora, pela editora Skira, do Dizionario giuridico dell’arte e Leggi della moda: os dois primeiros manuais reais sobre esse setor publicados na Itália.

Recentemente escreveu, aparentemente como lazer, mas na verdade para afirmar os valores do Made in Italy e do Italian way of living and doing, dois pequenos livros: Eleganza alla Milanese e Le italiane sono le più elegante (anche in casa).




Unsatisfashion: Por que você acha que deve existir o direito da moda? Como ele funciona? Se possível, gostaríamos de saber a sua visão sobre o perfil italiano, sobre a questão do made in Italy e sobre a moda italiana.

Silvia Segnalini: O direito da moda não existe para os acadêmicos: é só um âmbito do direito comercial e do direito industrial, com aspectos vários do direito civil e penal. Mesmo se a taxonomia acadêmica ainda faz uso das velhas classificações, eu acho que é importante pensar sobre o industry e sobretudo no caso italiano já que tem uma indústria muito importante que se caracteriza em nível cultural, estético e numérico (a indústria da moda é a segunda indústria que contribui ao PIB do nosso pais). Por isso, o Made in Italy é absolutamente identificativo e deve ser protegido: falar de direito da moda serve, então, para tratar do modo certo todos os instrumentos que são necessários para a proteção dos assets materiais e imateriais que formam a indústria da moda.

Unsatisfashion: Qual você acha que é a situação italiana sobre as falsificações das marcas italianas?

Silvia Segnalini: É estranho que alguém me faça essa pergunta: a nível de percepção pessoal atual, o mundo da moda parece ter elaborado e se deixado contaminar pelo exemplo de Chanel que – em uma das suas tantas “batalhas” com a rival italiana Schiapparelli – a aconselhava a começar a se preocupar quando não a copiassem mais, e não quando a copiassem.

Isso também serve para falar que o tema a cópia tem sua tradição e uma sentido positivo. Hoje parece que o sistema da moda não está mais obcecado sobre esse aspecto, mas, na verdade, se obceca mais sobre os temas da sustentabilidade e da rastreabilidade por meio de sistemas de blockchain (que, desde o ponto de vista regulatório e legal ainda está pouco definido), com o qual se acredita que é possível resolver os problemas das copias e da falsificação. Não quero abrir um parêntesis muito longo sobre a blockchain, mas comento somente como provocação. No meu caso, como acadêmica e estudando, tenho a impressão que querem atribuir muitos “super-poderes” a ela como se pudesse ser a solução de muitos problemas.

De todo modo, o caso dos produtos falsificados é um tráfico organizado em nível internacional que pode pesar diversamente na economia de uma única marca de moda (pode pesar também, no caso dos de marcas menos pop, menos status symbol e, logo, menos copiadas). Adiciono também que, com base as análises dos últimos trends, foi possível observar como que as cópias também têm um impacto diferente segundo a área geográfica: por exemplo, o mercado e a clientela europeia estão mais “saturados” de brands, logos e produtos falsificados...

Unsatisfashion: Desde um ponto de vista mais “filosófico”, quais são as razões pelas quais as pessoas passam a comprar produtos falsificados?

Silvia Segnalini: É difícil de responder, quem sabe não é uma pergunta do meu âmbito. Seria necessário perguntar aos analistas que observaram as tendências que fazia referência na pergunta anterior. Em um primeiro momento eu responderia que, na verdade, se trata de um problema de “busca de status” que, provavelmente, em um mercado como o europeu, mais saturado e maduro no que diz respeito ao consumo de bens de moda e luxo, os consumidores não se satisfazem mais somente com a posse de bens mas, por exemplo, com as experiences. Em outros mercados (penso o sudeste asiático), a situação, inclusive a cultural, é muito diferente.

Unsatisfashion: O que você nos pode dizer sobre os produtos falsificados que tem preços muitos altos e são praticamente indistinguíveis dos “originais”?

Silvia Segnalini: Aqui também não acho que tenho as competências certas pra responder essa pergunta: posso só dizer que, como mulher europeia – e que, portanto, desenvolvi um certo “olho” para o mercado dos bens de moda e luxo – não existem produtos indistinguíveis dos originais. Eu... – e todos os olhos bem treinados – os distingo muito bem!

Unsatisfashion: O É possível definir e avaliar a originalidade de um produto em termos jurídicos?

Silvia Segnalini: Claro! toda a disciplina da propriedade intelectual e industrial existe para esse fim. Mas é difícil resumi-la, até porque o discurso é muito complexo e varia muito quando se trata da Alta Moda ou do prêt-à-porter. Aprofundando, me permito encaminhar a conversa para os capítulos “Alta moda” e “Pret-a-porter” do livro Le leggi dela Moda. Adiciono só que toda a temática da avaliação do valor do mercado - que é um asset intangível no balanço de uma Maison de moda – é uma questão muito técnica e delicada, que é tratada pelos justos profissionais, para uma correta valorização desse asset.

Unsatisfashion: Como o direito pode proteger, na Itália, a originalidade da moda uma vez que essa cria trends e é uma repetição de ideias?

Silvia Segnalini: Como todo o resto do mundo (não é um direito, o da moda, mas de vocação nacional...). Não se pode proteger absolutamente tudo, mesmo utilizando os instrumentos que o Direito coloca a disposição. E isso talvez seja bom, não? Lembremo-nos do que dizia Chanel a Schiapparelli!

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