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O legado de Cristóbal Balenciaga na alta-costura

Conheça a história de um dos maiores nomes da alta costura e aquele que revolucionou a silhueta feminina com perfeição e atemporalidade.






Por Ana Beatriz Hoffert


Na terça-feira, 11 de maio (2021), a Fédération de la Haute Couture et de la Mode confirmou que a próxima semana de alta-costura parisiense poderá ser presencial e acontecerá entre os dias 5 e 8 de julho na cidade luz. Com isso, além de um suspiro nas semanas de moda digitais que estavam acontecendo há um ano - desde o começo da pandemia de COVID-19 -, a fashion week marca a volta como convidada da grife Balenciaga após 53 anos distante do cenário da alta-costura. Essa novidade volta a jogar os holofotes as criações do célebre Cristóbal Balenciaga, fundador da marca e um dos nomes mais importantes do haute couture.

Balenciaga, que nasceu em 21 de janeiro de 1895 na cidade de Guetaria na Espanha, é um dos estilistas mais icônicos que tem uma legião de fãs e admiradores ao redor do mundo. Com seu talento e perfeição, inspirou grandes nomes da moda como Christian Dior, Hubert de Givenchy, Oscar de la Renta, e sua influência ainda é sentida nos dias de hoje no mundo da moda.


Discreto, elegante e reservado

Com origem humilde, sua infância foi um tanto quanto clichê: devido a mãe costureira, o menino passava horas observando seu trabalho e pegando gosto pela criação. Assim, aos 12 anos desenhou seu primeiro vestido e conheceu a alta-costura por influência da mulher mais poderosa da região: Micaela Elío y Magallón. A marquesa que reconheceu o talento de Balenciaga desde cedo, enviou o garoto a Madri para estudar alfaiataria e aos 24 anos de idade abriu seu primeiro ateliê em San Sebastian, noroeste da Espanha, quando sua genialidade logo foi percebida.

Com a abertura de duas outras unidades em Barcelona e Madri, Balenciaga passou a atender a Família Real espanhola e membros da alta corte, que disputavam suas criações. Mais tarde, em 1936, a guerra civil espanhola fez com que o designer se refugiasse em Londres e Paris, deixando seu país de origem de vez. Um ano depois, em 1937, o homem que era descrito como um personagem discreto, elegante e reservado, abriu sua loja - “A casa Balenciaga” - em Paris, capital da alta-costura.


O espanhol se destacava por ser mais do que um estilista, sendo um verdadeiro “arquiteto da moda”. Suas habilidades não se restringiam apenas à criação, pois era expert em tecidos, costuras e pontos. Os vestidos eram criados no corpo da cliente: um trabalho escultural, digno de um arquiteto experiente.

Extremamente perfeccionista, não tinha medo de inovar. Suas criações eram caracterizadas pela leveza absoluta, pureza e riqueza nos detalhes que até então não se recebiam atenção. As mais badaladas celebridades e membros da alta sociedade, que mesmo no meio de uma guerra mundial, viajavam o país para ver e comprar, estavam entre suas clientes.

Com orgulho da nacionalidade espanhola, Balenciaga fazia muitas referências às suas raízes e ao renascimento cultural. Além de produzir boleros inspirados nos toureiros, Diego Velázquez, Francisco de Zurbarán e Goya eram três grandes inspirações para suas criações, que combinavam com perfeição a arte da moda e da pintura. Essa relação foi explorada posteriormente pela exposição “Balenciaga e a pintura espanhola” no Museu Thyssen-Bornemisza em Madrid no ano de 2019.


Balenciaga também era devoto do catolicismo. A influência eclesiástica pode ser vista em algumas criações que se assemelham a uma batina, e aos cornettes usados pelas freiras.



O pós guerra

Com o fim da Segunda Guerra, Paris, a capital da alta costura foi sede do ateliê de três atemporais criadores com propostas totalmente diferentes. Coco Chanel, que produzia roupas desenhadas para a comodidade da mulher, Christian Dior com o “New Look”, consagrado pelo excesso de feminilidade e cinturas extremamente marcadas e afinadas, e Cristóbal Balenciaga, que se diferenciava desses dois por produzir formas arquitetônicas e inovar a silhueta da mulher que era pensada “fora” do corpo feminino.

Dior, seu maior concorrente e grande amigo, se consagrou com o New Look em 1947. Cinturas afinadas por espartilhos e cintas eram o look queridinho das mulheres naquela época, enquanto as criações de Balenciaga eram marcadas pelas mangas com aplicações, quadris arredondados, vestidos drapeados que acinturavam e se aproximavam da estética da época, além de seus famosos tailleurs.

Ainda nessa época, o espanhol foi o primeiro a utilizar cores vibrantes na alta costura. As criações na cor preta, que marcaram suas criações em uma época difícil para o estilista - quando parceiro faleceu - eram ainda muito predominantes mas dividiram o palco com o amarelo-vivo, o verde e o cor-de-rosa.


A transformação da silhueta

Os anos 1950 e 1960, além do auge da carreira do estilista, foram marcados por uma intensa modificação estética que revolucionou a silhueta feminina. O perfeccionismo e habilidade técnica de Balenciaga foram fundamentais para que em 1951 os ombros largos de suas criações deixassem de marcar a cintura, configurando uma parte superior reta e não afunilada. O contorno das roupas era criado independente do corpo da cliente, e a cintura marcada deixou de ser protagonista dando espaço às mais diferentes estruturações das peças de Balenciaga, que brincava com a silhueta de forma inédita.

O vestido-saco, a túnica, o vestido-camisa e toda sua fluidez permitiram essa mudança total na moda. Em 1957, o vestido baby-doll e os vestidos com cauda que se encurtavam na frente foram suas principais criações, com formas e movimentos singulares. Cinturas foram abaixadas, levantadas, apagadas, e tudo era feito com maestria.


O arquiteto da moda desenvolvia tecidos exclusivos para suas peças em parceria com tecelagens, o que mostrava todo seu conhecimento sobre o processo criativo. Tecidos sintéticos que tornavam suas capas e casacos impermeáveis foram uma grande inovação na época, assim como os tecidos pesados e extremamente luxuosos que construíam suas coleções.

Peças de metal ou materiais mais diferenciados eram colocadas dentro da roupa para que o caimento das peças fosse exatamente do jeito que o estilista imaginava. A sua sutileza se refletia até na maneira como a trama do tecido fazia a luz refletir sobre ele, e dessa forma, foi estruturando a silhueta para fora do corpo feminino, inovando e se afastando definitivamente do New Look.

Além do mais, as diferenças de Balenciaga e Dior não se davam apenas em suas composições. Balenciaga era visto como o “antítese do marketing”, enquanto o amigo gostava de aparecer para a imprensa. O mestre espanhol só deu duas entrevistas em toda sua trajetória, e nunca aparecia no final dos desfiles para receber os cumprimentos. Tinha uma forma própria de lidar com a imprensa, e em 1956 resolveu apresentar suas coleções sempre depois das maratonas oficiais de desfiles, para não ter que dividir páginas com outros estilistas. Também proibiu fotografias em suas apresentações, e as fotos divulgadas nas revistas da época, como Vogue e Harper's Bazaar, eram pré-selecionadas pelo estilista, sempre muito meticuloso.


Ainda em 1960, vestiu a futura rainha da Bélgica Fabiola de Mora y Aragón em seu casamento, 8 anos antes de decretar sua aposentadoria.


O prêt-à-porter

Com o final da década de 1960, o grande potencial de consumo da mulher moderna estava demonstrando que a alta-costura não era o modelo ideal para esse perfil. Novos tecidos e modos de produção estavam surgindo e Balenciaga, - apesar de sua visão inovadora -, era um grande purista, e não se sentia confortável em produzir roupas que não fossem de extrema qualidade e acabamento perfeito.

O surgimento do prêt-à-porter - modelo de negócio industrial que produz roupas de luxo em grande quantidade - liderado por Yves Saint Laurent, não animou Cristóbal, que fechou seu atelier em 1968 e retornou ao seu país natal. Em 24 de março de 1972 faleceu, deixando um grande legado como mestre dos volumes, e um dos nomes mais importantes da alta-costura.

Nos anos seguintes, “The World of Balenciaga” virou exposição no The Metropolitan Museum of Art em Nova Iorque. Celebrado em diversos museus em toda Europa, em 2011 ganhou um para chamar de seu. O “Cristóbal Balenciaga Museo” - que inclusive é explorado na terceira edição da revista Unsatisfashion, produzida pela Fashion For Future. O museu está localizado na cidade de origem do costureiro, abriga um grande acervo de peças e estudos, e tem como intuito reviver o legado desse grande estilista.


No contexto da marca que carrega o sobrenome do espanhol, o seu falecimento fez com que ela saísse dos holofotes. Somente em 1990, quando o francês Nicolas Ghesquière assumiu a direção criativa da marca, Balenciaga se tornou novamente sinônimo de luxo e sofisticação. Ghesquière reinterpreta os códigos da marca sem perder seu estilo, e faz um trabalho notável até que foi substituído por Alexander Wang, que trouxe um estilo gótico urbano à etiqueta.

Desde 2015 a marca é comandada por Demna Gvasalia. O substituto de Wang, que fundou a marca de streetwear Vetements, trouxe uma visão ampliada do mercado mundial com criações provocativas, mantendo a marca entre o ranking das mais desejadas do mundo de acordo com a plataforma Lyst. Assim, nos resta ficar de olho na próxima apresentação de alta-costura da grife que promete reviver a herança genial de Cristóbal Balenciaga com momentos lindos.


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