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A potência do artesanato de luxo e a arte do handmade

Atualizado: 30 de ago. de 2022

Apreciação da matéria-prima, tradição, inovação e uma grande carga cultural. Essas características são compartilhadas entre o mercado de luxo e o mundo do artesanato, que quando juntos, prometem grandes momentos nas passarelas nacionais e internacionais.


técnica "intreciatto" nas criações de Bottega Veneta


Por Ana Beatriz Hoffert


O artesanato, normalmente definido por peças feitas a mão com o uso de muitos materiais naturais, é uma manifestação cultural. Crochê, macramê, bordado, entre outras centenas de técnicas têxteis usadas por artesãos ao redor do mundo vêm cada vez mais sendo encontradas em coleções de casas de luxo. Porém, a valorização das peças “gringas” não é a mesma encontrada por pequenos produtores regionais fora da Europa, que além da habilidade, carregam sonhos e histórias. Ademais, discussões sobre apropriação cultural e até sobre a chamada "síndrome de vira-lata” são postas em cheque ao observar essa diferença na valorização da mão de obra manual, que mais do que a diferença exorbitante de preços, encontra dificuldades em se manter vivo no Brasil e em todos os países da América Latina, mas também em comunidades tradicionais da Ásia, África e também em muitas regiões dos Estados Unidos.


Mas isso não quer dizer que não tenhamos artesanato de luxo nesses territórios. No Brasil temos Martha Medeiros como um grande nome da moda nacional, que transformou as técnicas ancestrais do sertão em vestidos de renda regional nordestina, e possui grande prestígio dentro do mercado de luxo. A rendeira alagoana herdou as habilidades artesanais de sua avó, e já apresentou suas criações ao lado de grandes nomes internacionais como Yves Saint Laurent e Dior.



A habilidade de Martha também é compartilhada entre centenas de famílias nordestinas que encontram o artesanato como forma de sustento no agreste. Para a revista Unsatisfashion, a estilista Luma Guarçoni mapeou 4 comunidades de rendeiras que fazem da habilidade grande patrimônio cultural da região, e acumulam repertórios que não possuem devida visibilidade nacional, mas têm grande peso na economia, cultura e turismo local.


Síndrome de vira-lata


Dessa forma, a extensa cultura artesanal brasileira não é devidamente valorizada por estigmas herdados de uma desigualdade regional que nos faz desvalorizar a cultura local, o que é popularmente chamado de "síndrome de vira-lata”. No Brasil, o feito a mão não confere grande prestígio social e normalmente é associado a comunidades de baixa renda e até mesmo escolaridade - o que é um grande erro -, fazendo com que a elite local não valorize a expertise do trabalho manual que exige muito mais cuidado e tempo do que produtos industrializados.


Um polêmico lançamento da Prada levantou essa questão ao apresentar uma sandália de couro feita a mão que é muito similar às centenárias sandálias artesanais encontradas no nordeste. As peças, com valor aproximado de 4.400 reais, se esgotaram no site da grife rapidamente: esse valor é quase cem vezes mais do que o preço praticado no mercado de artesanato brasileiro. Por mais que o preço não possa ser comparado - já que a Prada é uma etiqueta de luxo consolidada no mercado que atrai consumidores com enorme poder aquisitivo -, o valor artesanal imaterial se assemelha ao “handmade” que é tão almejado por consumidores que buscam exclusividade em marcas internacionais e acabam fechando os olhos para a potência do comércio local.



A valorização internacional


A italiana Bottega Veneta construiu seu nome por meio da premissa do handmade. Com o trançado característico de suas peças, a técnica “intrecciato” é feita manualmente há mais de 50 anos, estimulando a abertura de uma escola específica para especializar artesãos nessa técnica. Loewe, marca de luxo espanhola, também tem uma história parecida. Grife que nasceu a partir de uma comunidade de artesãos dedicados ao couro, o atual diretor-criativo Jonathan W. Anderson não deixa essa essência se perder, sempre trazendo colaborações que valorizam as técnicas artesanais.



Nas passarelas internacionais de 2021 confirma-se a potencialidade do artesanato de luxo. No desfile pre-fall 21, Pierpaolo Piccioli reinventou a identidade da Valentino com movimentos contemporâneos, e trouxe o artesanato para uma bolsa Rockstud feita de tricô com aplicações das famosas spikes da marca. Já Maria Grazia Chiuri trabalhou em conjunto com artesãos italianos na coleção Cruise 2021 da Dior. A aplicação de rendas e bordados transformou os vestidos da grife em verdadeiras obras de arte, construídas em conjunto com a fundação Le Constantine, que promove a formação de mulheres na cultura do artesanato local.



Outra marca que cita bastante o artesanato é a Dolce & Gabbana. Em 2012 Stefano Gabbana e Domenico Dolce fundaram o “Botteghe di Mestiere”, projeto que visava formar novos talentos para o trabalho manual dos estilistas. Valorizando sua cultura local, é possível encontrar rastros do artesanato siciliano em diversas coleções apresentadas. “A Itália é rica em tradições artesanais que mudam de cidade para cidade, de vila para vila. Nosso país é uma fonte inesgotável de inspiração e habilidade artesanal que deve ser mantida viva”, explica Domenico Dolce em entrevista à Baazar.



Os acessórios artesanais também possuem grande prestígio nas passarelas. As bolsas em palha são repetidamente apresentadas de diversas formas em coleções nacionais e internacionais. Chanel, Valentino, Osklen e Borana já marcaram presença com a peça que saiu da pegada praiana e agora complementa looks urbanos. De forma democrática, as trends artesanais podem ser compradas em vendedores locais ou até numa tentativa do “faça você mesmo”, que além de mais sustentável, ajuda a economia local e valoriza pequenos produtores com muito talento.


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